anotações de uma cultura acelerada

Artur Shamrock e Lucinda Sans-Script (2)

Passou meia hora em que Stu (demasiado ambicioso... queria mesmo ficar com o seu emprego) o interrompeu para relatar a compra de três discos - ok, mais três pregos para o caixão; meia hora em que pôs os auscultadores, ligou o leitor de mp3s e procurou "The Host of Seraphim" na directoria new age; meia hora em que a Mãe telefonou para combinar um fim de semana que não podia ser. Entretanto, Shamrock foi desenvolvendo um labiríntico e intrincado curso mental de 30 minutos sobre directorias e matérias aplicadas. Não deveria render-se às evidências e abrir uma pasta denominada "4AD"?, onde podesse albergar toda uma série de bandas que vagueavam despernadas pelo seu disco rígido, errando sem sentido em convenções pouco significativas? É certo que os Black Tape For a Blue Girl ou os All About Eve não pertenciam à editora, mas também não cabiam no lugar dos Medicine ou dos Christian Death. E já lhe bastava o Stu a competir por posições e assentos. Não queria a bandalheira institucionalizada no arquivo; afinal de contas, era uma oligarquia mínima controlada por ele e ele próprio. Escreveu "4AD Sound" e ficou satisfeito: assim as músicas não ficavam melindradas.
Um ruído no computador assinalou um novo mail de Lucinda:
"je suis a very stylish girl!
pensa nos remorsos, e no que te poderá acontecer, se for ao concerto dos gallon drunk sozinha...."

Shamrock carregou na opção "responder de volta":
"não tens hipóteses: o james johnston vive com a geraldine swayne. há dias mostrei-te o dueto em que documentavam a relação."
A sequela chegou na forma do toque de mensagens do telemóvel: uma mms com os lábios pintados de Lucinda e a inscrição "je suis a very stylish girl".

Blog de Pedro Lago

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